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Channel: Blog do Rui Craveiro
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Planador 69 e a roda de cauda

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Foi em 2007, em plena semana de campeonato, e eu tinha acabado de descolar com o planador 69 a ser puxado pelo avião que eu pilotava. A sigla 69 não tinha qualquer conotação sexual. Calhou ser a sigla de competição daquele planador. Apesar de ser semana de campeonato e de ser um planador com identificação de campeonato, nesse dia, o piloto estava a fazer um voo individual de passeio e não a participar no concurso.

Oiço no rádio:
- Planador 69, Operações.
- Operações, Planador 69 prosiga.
- Planador 69, Operações, mantem a calma, mas é só para te avisar que descolaste com a dolly.

A dollyé uma roda que se prende à cauda de alguns planadores para facilitar o manuseamento manual dos mesmos no chão. A única utilidade da mesma é apenas no chão e não é suposto que o planador vá para o ar com a dita agarrada. Não obstante a degradação aerodinâmica, não representa um enorme perigo.

Logo de seguida eu digo no rádio:
- Planador 69, D-CD, mantem a calma. Não és o primeiro a descolar com a dolly e sempre correu bem.

Sou complementado por outra vozes no rádio:
- Mantém a calma, António e aterra normalmente.

Tal como tínhamos aconselhado, o António manteve a calma e lá aterrou o planador com a maior das seguranças sem qualquer problema.

No dia seguinte, estava eu junto às operações enquanto outro piloto rebocava e o planador 69 dava novamente início a um voo. Não resisti e agarrei na rádio:

- Planador 69, operações.

Passado uns segundos e com um tom apreensivo pelo que tinha acontecido na véspera:
- Operações, planador 69, transmite.
- Planador 69, operações, mantem a calma, mas é só para te avisar que descolaste sem a dolly.

Mais uns segundos  de silencio e vem a resposta merecida, com um tom simultaneamente jocoso e de alívio:
- Operações, planador 69, vão mas é gozar com o raio que vos parta!

Quem nos dera a todos que os eventos de hoje tivessem sido apenas o pequeníssimo incidente que houve em 2007 e do qual até nos rimos no fim. Infelizmente hoje foi muito mais que uma dolly esquecida. Eu não era amigo intímo do António Conde, mas do pouco que eu o conheci, tinha a imagem de uma excelente pessoa e que os seus familiares e amigos estão a sofrer imenso. Também sei que a nossa comunidade de vôo à vela perdeu uma pessoa excepcional e muito dinamizadora. Sinto muito pela perda terrivel (literalmente!) e como eu gostaria de imaginar que o António está algures a voar com todo o prazer do mundo e sem a preocupação da roda de cauda.

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